quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Segunda Sombra - Jenna





         Dou uma última tragada no cigarro. Sei que essa será realmente a última, então inspiro com força... e solto o ar. O último dos últimos.
         Penso em tudo que estava acontecendo. Eu não iria me matar. Eu já estava morta. E afinal, que outra saída há para mim?
         Boto agora de lado meu cigarro, ainda sentindo a queimação da fumaça em meu organismo. Abro todas as janelas do meu apartamento; moro no vigésimo sétimo andar, e acredite, me sinto mais protegida assim. É a única coisa que parece bem: estou praticamente no céu.
         Retiro todas as roupas de meu corpo e me olho no espelho que há na sala. O ar que sai das janelas é frio, mas acabo não sentindo nada. Sei que levará pouco tempo, quase nada. Ou assim espero.
         Passo a mão por mim mesma mais uma vez, lembrando de todos que já me tocaram. Todos sujos, todos podres, todos esquecidos. Para mim, enterrados há tempos no fundo da mente e só trazidos à tona pelas dores.
         Viro-me de lado e analiso as curvas de meu corpo. A barriga ainda não começou a crescer, mas sei que isso é tão certo quanto a chuva que cairá mais tarde. Está escrito nas estrelas, e vai acontecer.
         Penso na criança que se encontra dentro de mim. Provavelmente uma migalha de pão ainda, mas uma criança de qualquer modo. Minha criança.
         As lágrimas lutam para cair, mas seguro-as com força. Não chorarei por isso, prometi à mim mesma.
         O pai da criança eu nem sabia quem era. Descobri há pouco que estava grávida, e este foi somente mais um fator para que eu decidisse fazer isso. Não havia como dar uma vida decente para ele, uma vida boa. E não queria que fosse criado como eu fui.
         A minha vida se perdera há anos. Nunca tive mãe, pai, família, namorado, amor... nunca. Eu sempre fui usada, jogada e pisada por todos. E se fosse para colocar mais alguém no mundo, não seria dessa forma.
         Já disse que a vida é cruel? As pessoas são cruéis, não há piedade, humildade, aceitação... tudo que se vê é preconceito, dor, sofrimento. E eu não desejo a ninguém uma vida assim.
         Vou em direção ao banheiro e pego a escova que veio junto a mim no orfanato em que fui deixada. A única prova de que realmente havia sido abandonada. A prova fatal.
         Penteio meu cabelo e noto que, apesar de meu rosto estar magro, minha pele estar cinzenta e meu coração não aguentar mais bombear sangue, estou bonita. É quase como se um último brilho ainda surgisse em meus olhos, mas em menos de meio segundo, este brilho desaparece. E a beleza vai junto.
         Olho para os lados. Ali está a velha banheira que eu usara durante pelo menos um terço de minha vida. É ali que quero morrer, ali onde minha vida mudara.
         Ligo a água, e enquanto jorra, penso em quando ainda era criança. Uma criança perdida, esquecida. Uma criança que faria de tudo por um pouco de carinho, um pouco de afeto. Mas eu mudara. Eu havia ficado dura, triste, brava. Eu havia mudado, contanto, o mundo não. Ele continua como sempre foi.
         Faço menção a entrar na banheira, mas antes disso, me abaixo e abro a última gaveta. Lá, debaixo de algumas toalhas, pego o objeto que guardara durante muito tempo. Um revólver, uma bela e brilhante arma.
         Levanto novamente e encosto a arma em minha cabeça. Olho para o espelho e respiro fundo.
         Abaixo o revólver e entro na banheira. Depois de alguns minutos, decido que chegou a hora.
         Pego novamente a arma e coloco logo acima de minha orelha, mirando a cabeça. Uma pequena lágrima escorre de meus olhos, e eu preparo-me para puxar o gatilho.
         Antes que de acabar logo com tudo, pouso a mão sobre minha barriga.
         “Por você, meu filho.”
         E puxo o gatilho.

By Babi

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