Logo depois de voltarmos para casa, eu e Jason resolvemos sair novamente. Não queríamos ficar em um lugar onde as pessoas não confiavam em nós dois e só nos toleravam por sermos necessários para a recuperação de Bianca. Nós éramos apenas peças no quebra-cabeça da mente de Bia.
Aprofundamos-nos na floresta em silêncio até o momento em que comecei a escutar chiados. – Você escutou isso, Jason? – perguntei, virando-me para o local de onde o som viera.
-Não, Cami – respondeu meu primo, seguindo em frente no bosque. Porém, permaneci no mesmo local, tentando reconhecer o que estava prendendo tanto minha atenção.
Foi então que enxerguei o pequeno esquilo que descia a árvore. Minha respiração parou e, novamente, as lembranças me inundaram, roubando a pouca força que meu corpo tinha adquirido nas últimas semanas sem flashbacks.
Já haviam se passado duzentos anos desde a minha morte e a de Jason. Estávamos de volta ao nosso antigo Reino para checar se tudo estava correto e tentar encontrar de alguma forma a atual reencarnação de Bianca. Duvidávamos que ela fosse da família real, já que, como Madeleine teve apenas a princesa e esta não continuou a linhagem, outra família tomara o poder.
Jason partiu diretamente para o comércio local, pois sonhara na noite anterior que Bianca era filha de um burguês. Eu, entretanto, me dirigi para o lugar onde esperava encontrar descanso e paz: o cemitério.
Sempre fora sombria demais. Não gostava de sol, adorava lugares reclusos e um bom dia nublado era a minha opção favorita. Então, via nos cemitérios a oportunidade perfeita para me desligar do mundo à qual fora aprisionada pela eternidade.
Porém, chegando ao cemitério, acabei encontrando uma família visitando um túmulo. Não escutei seus nomes durante a conversa que tinham, mas reparei o sobrenome inscrito na lápide: Sierte.
-Nós temos que partir daqui o mais rápido possível. Nossa filha não pode ficar exposta a um lugar como esse. As pessoas estão morrendo. Ela não merece nascer em um Reino em que todas pessoas morrem ou viram vampiros!
-Você não pode culpar os vampiros pela morte de nosso filho. Ele resolveu travar uma guerra contra o bando mais perigoso de bandidos do Reino. Ele sabia no que estava se metendo!
-Não, ele não sabia! O nosso filho esperava ajudar o Reino, acabando com aquela gente! Como ele poderia sequer imaginar que se tratavam de vampiros? – gritou o pai do menino. Ele parecia um camponês dedicado, enquanto sua mulher, grávida, me lembrava muito uma nobre falida.
-Não importa mais. Nosso doce filho foi embora para um lugar melhor e é nossa hora de sair desse Inferno – disse a mãe, virando-se de costas e caminhando para longe da lápide. O pai deu um delicado na tapinha na ponta da pedra, como se cumprimentasse o ente perdido.
Depois que os pais se afastaram do local onde seu filho descansava eternamente, resolvi me aproximar. Porém, antes de chegar à lápide, deparei-me com um esquilo animado que destruía a imagem triste do cemitério. Ele parecia comemorar a vida, enquanto todos choravam a morte.
Abaixei-me e toquei-o, tendo a esperança de que ele me transmitisse algo bom, de que me tirasse da depressão eterna em qual entrara. Antes que pudesse desistir daquela ideia absurda, seus pequeninos olhos brilharam e percebi que, de alguma forma, o esquilo me entendia.
Quando preparava-me para retornar à realidade, escutei um ruído baixo atrás de mim. Ao virar, deparei-me com Jason. Ele estava vestido todo de preto, como costumava fazer desde que Bianca desaparecera pela primeira vez há duzentos anos.
-O que você está fazendo no cemitério de novo, Camile? – perguntou irritado meu primo. Ele odiava minhas visitas àquele lugar cheio de mortos. Para Jason, eu estava me tornando a pior espécie de vampiros: aquela que preferia a morte a aproveitar uma eternidade repleta de surpresas.
-Eu só estava tentando me distrair – respondi, evitando a frase que queria sair de meus lábios: eu só estava comemorando minha morte pela centésima vez, o que você acha?
Jason revirou os olhos, sabendo que eu estava mentindo, e se aproximou da lápide. Quando lemos o nome na lápide naquela época, parecia algo insignificante. Só mais um morto pelo mesmo motivo que estávamos “vivos”.
Porém, agora, vivendo no século XXI, tudo era diferente. Saí de minhas lembranças e com os lábios tremendo, gritei o nome de Jason. – Cami! O que houve? – perguntou meu primo, alcançando-me.
-Lembra-se daquela lápide que nos pareceu tão insignificante em 1700 e tanto? – Lembro sim, Camile. Por quê? – o loiro parecia apreensivo com minhas palavras, como se eu fosse uma louca.
-Então... – nem precisei completar. O choque percorreu o rosto de Jason como se ele acabasse de ver um fantasma. Bem, ele havia visto algo quase assim durante toda a manhã.
-Meu Deus – dissemos juntos, absorvendo a importância daquela revelação à história de nossas reencarnações.
Escrito por StarGirlie.